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O ENEAGRAMA EM MACHADO DE ASSIS

O ENEAGRAMA EM MACHADO DE ASSISMachado de Assis a quem podemos definir como Tipo Quatro pela sua aguda sensibilidade em aprofundar na alma humana descreveu as virtudes e paixões em seu livro A Igreja do Diabo.
Sintetizo aqui os diálogos entre Deus e o Diabo demonstrando um tema sensível a Jung, o jogo de forças entre o bem e do mal, entre a sombra e a Luz. Entendo que este diálogo traduz a essência do Eneagrama: o Ser humano está condenado a viver a dualidade Bem e Mal. A Personalidade Humana é fruto e resultado destas duas forças que na segunda etapa de nossas vidas torna-se a forca motriz de nossa existência. Na primeira fase as questões da biografia, família, relacionamento social, sexual e profissional dominam o palco de nossa existência. Na segunda fase, Jung dizia após os 40 anos as questões essências estão relacionadas a espiritualidade versos sucesso de nossas necessidades básicas.
”conta um velho manuscrito beneditino que o Diabo, em certo dia, teve a ideia de fundar uma igreja. Embora os seus lucros fossem contínuos e grandes, sentia-se humilhado com o papel avulso que exercia desde séculos. (…) vivia(…) dos remanescentes divinos, dos descuidos e obséquios humanos.
Nada fixo, nada regular. Por que não teria ele a sua igreja?
(…) Em seguida, lembrou-se de ir ter com Deus para comunicar-lhe a ideia. (…)
Deus recolhia um ancião, quando o Diabo chegou ao céu. Os serafins que engrinaldavam o recém-chegado, detiveram-se logo, e o Diabo deixou-se estar à entrada com os olhos no Senhor. — Que me queres tu? Perguntou este.
— Não venho pelo vosso servo Fausto, respondeu o Diabo rindo, mas por todos os Faustos do século e dos séculos. Fausto é um arquétipo da alma humana. * (nota do autor)

Fausto é o protagonista de uma popular lenda alemã de um pacto com o demônio, baseada no médico, mago e alquimista alemão Dr. Johannes Georg Faust (1480-1540, Homem das ciências que, desiludido com o conhecimento de seu tempo, faz um pacto com o demônio, que o enche com a energia satânica insufladora da paixão pela técnica e pelo progresso.

— Explica-te.
— Senhor, a explicação é fácil; mas permiti que vos diga: recolhei primeiro esse bom velho; dai-lhe o melhor lugar, mandai que as mais afinadas cítaras e alaúdes o recebam com os mais divinos coros…
— Sabes o que ele fez? Perguntou o Senhor, com os olhos cheios de doçura.
— Não, mas provavelmente é dos últimos que virão ter convosco. Não tarda muito que o céu fique semelhante a uma casa vazia, por causa do preço, que é alto. Vou edificar uma hospedaria barata; em duas palavras, vou fundar uma igreja. (…) Podemos entender a igreja do diabo como a estruturação da personalidade Humana. A Personalidade Humana terá sempre como alicerce as paixões do Eneagrama.
–Boa ideia, não vos parece?
— Vieste dizê-la, não legitimá-la, advertiu o Senhor.
— Tendes razão, acudiu o Diabo; mas o amor-próprio gosta de ouvir o aplauso dos mestres. (…)
— Vai. — Quereis que venha anunciar-vos o remate da obra?
— Não é preciso; basta que me digas desde já por que motivo(…) só agora pensaste em fundar uma igreja. (…)
— Só agora concluí uma observação, começada desde alguns séculos, e é que as virtudes, filhas do céu, são em grande número comparáveis a rainhas, cujo manto de veludo rematasse em franjas de algodão. Ora, eu proponho-me a puxá-las por essa franja, e trazê-las todas para minha igreja; atrás delas virão as de seda pura… ( as Virtudes são irmãs gêmeas das Paixoes,bem e mal são indissociáveis na condição humana)Nota do autor.
(…) Deus interrompeu o Diabo. — Tu és vulgar, que é o pior que pode acontecer a um espírito da tua espécie, replicou-lhe o Senhor. (…). Esse mesmo ancião parece enjoado; e sabes tu o que ele fez?
— Já vos disse que não.
— Depois de uma vida honesta, teve uma morte sublime. Colhido em um naufrágio, ia salvar-se numa tábua; mas viu um casal de noivos, na flor da vida, que se debatiam já com a morte; deu-lhes a tábua de salvação e mergulhou na eternidade. Nenhum público: a água e o céu por cima.
Onde achas aí a franja de algodão?
— Senhor, eu sou, como sabeis, o espírito que nega.
— Negas esta morte?
— Nego tudo. A misantropia (paixão do Cinco) pode tomar aspecto de caridade; deixar a vida aos outros, para um misantropo, é realmente aborrecê-los…
— Retórico e sutil! exclamou o Senhor. Vai, vai, funda a tua igreja; chama todas as virtudes, recolhe todas as franjas, convoca todos os homens…, Mas, vai! vai! (…) ( segundo o Eneagrama Tanspessoal a formação da personalidade implica em esconder as virtudes e fazer com que as paixões tornem se as forcas dominantes do comportaemntos, sentimentos e pensamentos humanos)
O Diabo sentiu, de repente, que se achava no ar; dobrou as asas, e, como um raio, caiu na terra. ( aqui temos uma alegoria ao mito de Adão e Eva expulsos do Paraiso: a Queda Humana!)
Uma vez na terra, o Diabo não perdeu um minuto. Deu-se pressa em enfiar a cogula beneditina, como hábito de boa fama, e entrou a espalhar uma doutrina nova e extraordinária, com uma voz que reboava nas entranhas do século.

Ele prometia aos seus discípulos e fiéis as delícias da terra, todas as glórias, os deleites mais íntimos(…). Clamava ele que as virtudes aceitas deviam ser substituídas por outras, que eram as naturais e legítimas. (as paixões)
A soberba, a luxúria, a preguiça foram reabilitadas. (…)
A avareza, que declarou não ser mais do que a mãe da economia, com a diferença que a mãe era robusta, e a filha uma esgalgada. (A virtude uma magricela)

A ira tinha a melhor defesa na existência de Homero; sem o furor de Aquiles, não haveria a Ilíada: “Musa, canta a cólera de Aquiles, filho de Peleu…” (a ira criando grandes obras…)

O mesmo disse da gula, (…)virtude tão superior, que ninguém se lembra das batalhas de Luculo, mas das suas ceias; foi a gula que realmente o fez imortal. (…)
Quanto à inveja, pregou friamente que era a virtude principal, origem de propriedades infinitas; virtude preciosa, que chegava a suprir todas as outras, e ao próprio talento. As turbas corriam atrás dele entusiasmadas.
Nada mais curioso, por exemplo, do que a definição que ele dava da fraude. (Paixão do Tipo Tres- Mentira). Chamava-lhe o braço esquerdo do homem; o braço direito era a força; e concluía: Muitos homens são canhotos, eis tudo. Ora, ele não exigia que todos fossem canhotos; não era exclusivista. Que uns fossem canhotos, outros destros; aceitava a todos, menos os que não fossem nada.
A demonstração, porém, mais rigorosa e profunda, foi a da venalidade. (Ainda outro adjetivo para o tipo Três)
Venalidade é uma característica do comportamento humano associado à suscetibilidade de se ser subornável ou de vender seus serviços ou de poder
A venalidade, na sua forma mais suave, é um vício notável especialmente entre aqueles com carreiras administrativas, governativas ou militares
Em contraste, ninguém ficaria surpreso de encontrar um comerciante ou pessoa contratada para a tomada de decisões profissionais por razões venais. Na verdade, Adam Smith e outros economistas de uma linha mais libertária poderiam argumentar que a venalidade é uma virtude, porque ajuda a criar a “mão invisível” que controla as forças de mercado.

A venalidade, disse o Diabo, era o exercício de um direito superior a todos os direitos. Se tu podes vender a tua casa, o teu boi, o teu sapato, o teu chapéu, coisas que são tuas por uma razão jurídica e legal, mas que, em todo caso, estão fora de ti, como é que não podes vender a tua opinião, o teu voto, a tua palavra, a tua fé, coisas que são mais do que tuas, porque são a tua própria consciência, isto é, tu mesmo? Negá-lo é cair no absurdo e no contraditório. Pois não há mulheres que vendem os cabelos? não pode um homem vender uma parte do seu sangue para transfundi-lo a outro homem anêmico? e o sangue e os cabelos, partes físicas, terão um privilégio que se nega ao caráter, à porção moral do homem?
( diabo gasta um tempo enorme em descrever a venalidade, talvez possaos entender como a paixão de maior impacto no contexto social. No mundo atual a venalidade venceu! O Capitalismo éesencial numero Tres. É a normose instaldada. Isto significa que a paixão do três é o ideial social de nossos tempo!) N.A.
Capítulo IV Franjas e franjas A previsão do Diabo verificou-se.
( no Eneagrama a previsão do Diabo vence, as paixões dominam o ser humano normal)
Todas as virtudes cuja capa de veludo acabava em franja de algodão, uma vez puxadas pela franja, deitavam a capa às urtigas e vinham alistar-se na igreja nova. Atrás foram chegando as outras, e o tempo abençoou a instituição. A igreja fundara-se; a doutrina propagava-se; não havia uma região do globo que não a conhecesse, uma língua que não a traduzisse, uma raça que não a amasse. O Diabo alçou brados de triunfo.
( Machado de Assis usa o veludo e a seda como metáforas para as virtudes e a franja de alcodao, material menos nobre de segunda qualidade para as paixões humanas)
Um dia, porém, longos anos depois notou o Diabo que muitos dos seus fiéis, às escondidas, praticavam as antigas virtudes. Não as praticavam todas, nem integralmente, mas algumas, por partes, e, como digo, às ocultas.
Eis aqui o compexo de Jonas, esquecemos para a formação da personadidade, ara poder viver assustado neste undo nossa verdadeira essência. Na segunda fase de nossa existência quando obtivemos o sucesso que o mundo espera de nos, quando formamos nossos filhos e criamos ads condiçõesbasicas da vida ( casa, família, trabalho dinheiro) o barulho do big bang de nossa alma aparece, as virtudes exigem o seu lugar em nossa psique. Ai que a coisa pega,ai que a dor espiritual aparece. No sonho , nas doenças algo nos chama de nova para as virtudes que foram enterradas no deserto de nossas vidas.

Certos glutões recolhiam-se a comer frugalmente três ou quatro vezes por ano, justamente em dias de preceito católico; muitos avaros davam esmolas, à noite, ou nas ruas mal povoadas; vários dilapidadores do erário restituíam-lhe pequenas quantias; os fraudulentos falavam, uma ou outra vez, com o coração nas mãos, mas com o mesmo rosto dissimulado, para fazer crer que estavam embaçando os outros. A descoberta assombrou o Diabo. Meteu-se a conhecer mais diretamente o mal, e viu que lavrava muito. Alguns casos eram até incompreensíveis, como o de um droguista do Levante, que envenenara longamente uma geração inteira, e, com o produto das drogas, socorria os filhos das vítimas.

No Cairo achou um perfeito ladrão de camelos, que tapava a cara para ir às mesquitas.
O Diabo deu com ele à entrada de uma, lançou-lhe em rosto o procedimento; ele negou, dizendo que ia ali roubar o camelo de um drogomano; roubou-o, com efeito, à vista do Diabo e foi dá-lo de presente a um muezim, que rezou por ele a Alá.
O manuscrito beneditino cita muitas outras descobertas extraordinárias, entre elas esta, que desorientou completamente o Diabo.
Um dos seus melhores apóstolos era um calabrês, varão de cinquenta anos, insigne falsificador de documentos, que possuía uma bela casa na campanha romana, telas, estátuas, biblioteca, etc. Era a fraude em pessoa; chegava a meterse na cama para não confessar que estava são. Pois esse homem, não só não furtava ao jogo, como ainda dava gratificações aos criados. Tendo angariado a amizade de um cônego, ia todas as semanas confessar-se com ele, numa capela solitária; e, conquanto não lhe desvendasse nenhuma das suas ações secretas, benzia-se duas vezes, ao ajoelhar-se, e ao levantar-se. O Diabo mal pôde crer tamanha aleivosia. Mas não havia que duvidar; o caso era verdadeiro. (…)

Voou de novo ao céu, trêmulo de raiva, ansioso de conhecer a causa secreta de tão singular fenômeno. Deus ouviu-o com infinita complacência; não o interrompeu, não o repreendeu, não triunfou, sequer, daquela agonia satânica.
Pôs os olhos nele, e disse-lhe: — Que queres tu, meu pobre Diabo? As capas de algodão têm agora franjas de seda, como as de veludo tiveram franjas de algodão. Que queres tu? É a eterna contradição humana.

A Igreja do Diabo, de Machado de Assis Fonte: ASSIS, Machado de. Volume de contos. Rio de Janeiro : Garnier, 1884.

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